No livro "Crime e Castigo", escrito pelo romancista russo
Dostoiévski, figura uma tentativa de êxito pela busca da materialização de uma
experiência metalinguística (além da capacidade de descrição das palavras) que,
em tudo, possui o pleno potencial de desenhar um caminho de conversão através
do vislumbre estético. Para o romancista russo, a "beleza salvará o
mundo".
Segundo o seu
característico estilo literário de vislumbrar em meio às ruínas da humanidade
uma luz redentora de glória, o autor desenha uma personagem por nome de Sônia,
que fora levada pelos descaminhos da vida à prostituição, ainda que conservando
de maneira profunda a sua fé em Deus e uma esperança de superação daquela
situação tão ambígua e contraditória com relação às convicções que consigo
carregava.
Essa situação de
contradição mortal entre a convicção de fé de Sônia e o seu estado existencial,
assim como a força espiritual que plenificava a sua capacidade de suportar o
mundo degradado no qual vivia, preencheu de perplexidade e espanto o principal
personagem da trama, o jovem Rodion Románovitch Raskólhnikov, que após cometer
um crime fundado em alguns pressupostos niilistas, encontrava-se por isso em
uma agonia delirante, uma situação na qual só poderia escapar - acreditava -
por meio do suicídio.
Ao contemplar a força da
jovem Sônia, o atormentado Raskolhnikov pergunta a esta o que a impede de
cometer um suicídio, e abandonar aquela degradação na qual vivia, ao que ela
responde que o amor aos seus irmãos, à sua madrasta, e, principalmente, a
Cristo, do qual nutria uma fé excepcional e uma esperança de que, no fim das
contas, tudo aquilo daria certo, tal como ocorrera com Lázaro, aquele que foi
ressuscitado da morte como consta no Evangelho de João, era o que a impedia
deste "salto".
O corpo magro, as mãos
frágeis de Sônia, e a sua vida marcada pela prostituição e degradação humana
não deixou de ser um veículo da santidade e da glória que trouxe espanto à vida
do jovem assassino, assim como a possibilidade da percepção de uma beleza
espiritual que contraditara profundamente as suas convicções fatalistas,
potencializando o estado de perplexidade, não no sentido do suicídio, mas em um
outro sentido, que era o da experiência mística do reconhecimento de uma
realidade espiritual que confere razão e sentido para a vida, e forças para a
superação de toda a agonia existencial, descobrindo, assim, por meio desta
experiência estética, uma beleza inquebrantável e invencível em meio a um mundo
de ruínas e de degradação. Aqui, Sônia figura como um canal vivo da mensagem do
Evangelho de Cristo e do próprio Cristo.
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