Desse modo, fica bem clara a afirmação de Pelágio concernente à doação da graça de acordo com os méritos, qualquer que seja o significado que lhe dê, embora não se expresse com clareza. Pois, ao dizer que hão de ser recompensados os que fazem bom uso da liberdade e, por isso, merecem a graça do Senhor, confessa ser ela (a graça) pagamento de dívida.
Nesse caso, onde fica o dizer do Apóstolo: 'E são justificados gratuitamente por sua graça?' (Rm 3,24). E esta outra sentença: 'Pela graça fostes salvos'? E para não se pensar (ser salvo) pelas obras, acrescentou: 'Por meio da fé'. Evitando que se pense numa atribuição da própria fé sem a graça de Deus, diz: 'E isso não vem de vós, é dom de Deus' (Ef 2,8). Assim, o que marca o início de tudo o que dissemos receber por merecimentos, recebemos (a graça) sem eles, ou seja, recebemos pela fé.
E se alguém negar que nos é outorgada (ou que nos é dada como direito), o que significa o que foi dito: 'De acordo com a medida da fé que Deus dispensou a cada um'? (Rm 12,3). E se alguém disser que é retribuição pelos merecimentos, então não é dada. O que significa o que diz novamente: 'Pois vos foi concedida, em relação a Cristo, a graça de não só crerdes nele, mas também por ele sofrerdes'? (Fl 1,29). Testemunhou que ambas as coisas foram concedidas: o crer em Cristo e o parecer por Cristo. Os pelagianos, no entanto, atribuem a fé ao livre-arbítrio em tais termos que a fé parece ser uma graça devida, e não um dom gratuito. Assim não é graça, nem gratuita; não é graça.
Santo Agostinho - A Graça de Cristo e o Pecado Original. Ed. Paulus, p. 246,247
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