Alguém já havia me falado que o Mário Ferreira dos Santos seguia muito Hegel. E não deixa de ser curioso que ele denomina a sua filosofia como Filosofia Concreta, que é justamente o que Hegel dizia que deveria ser a filosofia, pois ela, a filosofia, não lidava com pensamentos abstratos, mas visava única e exclusivamente o concreto ao qual se chega pela via dialética (pela via negativa), até chegar ao positivo racional.
Também dizem que a maior obra do Mário Ferreira dos Santos lida justamente com aquilo que ele chamou de Decadialética, obra que usa muito desse desdobramento dialético da mônada que se auto-determina na díade, depois na tríade etc., muito semelhante ao que Hegel faz com a sua noção de autodeterminação da ideia que se desdobra em seu ser outro (na natureza), se resolvendo por meio do retorno a si da natureza como espírito, na tríade. Para Hegel essas são as três determinações do Espírito, Espírito que é, entre todos, o mais concreto, pois é a auto-efetivação livre do Absoluto.
Só para complementar: o que o Mário Ferreira dos Santos chama de mathesis magiste tem a ver com o que Heidegger chamou de espírito matemático dos gregos. Esse espírito matemático podemos rastrear até à maiêutica socrática, pois o elemento pressuposto da maiêutica é que o espírito se auto-determina até à diferenciação da razão, ou seja, Sócrates, ao partejar as ideias de seus interlocutores, não infundia nenhuma informação nova, nenhum espírito novo, mas apenas extraía a ideia que já estava latente no indivíduo até ele perceber como resposta sua aquilo que ele já possuía dormitando em seu próprio espírito.
Heidegger, assim, afirmava que o máximo da diferenciação da matesis (o espírito matemático) era justamente essa auto-determinação do espírito que segue uma evolução em que todas os momentos da sua auto-determinação são ligados por um espírito lógico, e que só porque lógico é também espírito. Por assim dizer, no mundo ocidental a matesis chegou à consciência de si na Lógica de Hegel, lógica que também é teológica (víde Hegel).
O contra-ponto a esse espírito, à matesis, foi colocado em uma oposição conhecida contra Hegel na filosofia religiosa de Kierkegaard. No Migalhas Filosóficas Kierkegaard expõe propriamente contra a matesis grega a noção da revelação cristã. E é da maior importância essa oposição para ilustrar certa tensão no pensamento ocidental. Pois Kierkegaard colocava a ideia de que para o grego, ou para o socrático, a ideia dormia no indivíduo, enquanto que para o cristão essa ideia vinha de fora, via revelação. Nesse sentido o mestre é, para o grego, a ideia interior, seu espírito que esperava a diferenciação e descompactação. Para o cristão, o mestre é o Cristo, e a sua luz vem de fora, o que olhado à luz da Providência, e da noção de que a revelação também concede informações das quais a razão não é capaz, tem todo sentido.
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