segunda-feira, 5 de julho de 2021

Simul Iustus et Peccator; Ou: Lutero, a Justificação e o Paradoxo

    A teologia da justificação protestante possui uma harmonização sistemática que ao menos parece estar longe de uma apreensão consciente das inúmeras igrejas evangélicas que se dizem caudátarias da teologia do reformador Martinho Lutero. Isso é visível pelo fato de que para muitos a relação entre a paixão de Cristo na cruz e a justificação é algo vagamente compreensível, sendo o nexo paradoxal que une as duas coisas, para alguns, algo tão claro quanto a vista de uma casa no alto de uma colina em uma dia de nevoeiro.

    Não obstante a isso, para Lutero a obra da cruz (mas também da ressurreição) de Cristo era o fundamento da justificação, justificação que para ele era o "articulo stantis te cadentis ecclesiae" (o artigo sobre o qual a igreja se mantém de pé ou cai). Entendamos: No famoso comentário a Gálatas 3.13 Lutero expõe a teologia da justificação nesses termos: "Em suma, ele tem e carrega todos os pecados de todos os homens em seu corpo. Não que ele os tivesse cometido, mas ele tomou os pecados, por nós cometidos, sobre seu corpo e os satisfez com seu próprio sangue"; e: "porque assumiu a pessoa de um pecador e ladrão".
    Contudo, a absorção da pena, da ira e do pecado por Cristo não seria algo efetivo se ele não fosse santo e justo em grau máximo. Assim, para a nossa salvação, por assumir a nossa pessoa pecadora, Jesus é "o supremo, máximo e único pecador" (declarativamente), mas também é "a suprema, máxima e única justiça" (efetivamente), como o atesta a ressurreição, ou seja: Jesus é também "simul iustus et peccator", e é só por ele assim vencer na cruz (pois a vida nele é maior) que ele pode conceder que aqueles que nele põem a fé sejam pecadores efetivamente, mas justos declarativamente, ou seja, simul iustus et peccator.

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