sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Uma Pequena Reflexão Sobre os Princípios

   


   O princípio do afeto é semelhante ao princípio da liberdade: não pode ser aplicado de maneira indefinida sem que ele se contradiga. Por exemplo: se concedermos liberdades absolutas a todos, a liberdade do mais forte tende a anular a liberdade do mais fraco. Portanto o reino da liberdade absoluta é o reino da Tirania, pois a liberdade requer uma ORDEM atuando em espaços definidos que protejam a própria liberdade da degeneração em tirania. 

   Assim também é o afeto ou a paixão do amor: o afeto NÃO PODE ser distribuído de maneira liberal sem que ele se contradiga a si mesmo, já que o amor afetivo não prescinde da FIDELIDADE, pois se a FIDELIDADE - que é um elemento discriminador, excludente de outras possibilidades, sendo um FUNDAMENTO do próprio amor - faltar, então TRAÍMOS as expectativas do outro a quem nós direcionamos o nosso afeto, fazendo com que o afeto ou a paixão degenerem em ÓDIO. O amor, no fim das contas, exige posse, segurança e discriminação e LIMITAÇÃO do afeto, e não a sua expansão indefinida. 

   Outro exemplo está no tão discutido princípio da tolerância, que semelhantemente aos outros dois princípios acima não pode ser aplicado de maneira indefinida sem que ele degenere no seu contrário, pois se formos indefinidamente tolerantes com tudo o que é bizarro e baixo na conduta humana daremos vazão, em nome da tolerância, ao mal que dizemos que combatemos, criando um inferno indescritível no mundo ao qual prometemos o paraíso. Sendo assim, a paz para que seja possível requer e exige, paradoxalmente, a existência da intolerância. Na verdade a tolerância requer em sua constituição a própria intolerância para que ela seja possível, já que a própria tolerância se faz em nome de um bem por meio da recusa de um mal, por exemplo: se somos tolerantes com o criminoso de maneira indefinida, nem por isso criaremos uma bondade por nossas atitudes naquele que possui a atitude criminosa. Em nome do bem o criminoso de sofrer de nossa parte uma intolerância a fim de tolher as possibilidades da existência de algo prejudicial a todos nós. 

   São por essas coisas que podemos afirmar que para que um indivíduo possa gozar de plena liberdade ele dever manter a regra em suas condutas, refreando os seus apetites, tal como afirma Edmund Burke: "Está ordenado na constituição eterna das coisas, que homens de espírito intemperante não podem ser livres. Suas paixões forjam seus próprios grilhões”; assim como também afirma Thomas Hobbes: "A lei natural (lex naturalis) é a norma ou regra geral estabelecida que proíbe o ser humano agir de forma a destruir a sua vida, ou privar-se dos meios necessários a sua preservação", e continua: "o homem deve concordar com a renúncia a seus direitos sobre todas as coisas, contentando-se com a mesma liberdade que permite aos demais, na medida em que considerar tal decisão necessária para a manutenção da paz e de sua própria defesa. Se cada qual fizer tudo aquilo a que tem direito, reinará a guerra entre os homens", nos deixando a máxima de que nenhum princípio deve, isoladamente de outros princípios, fornecer um imperativo categórico para nortear as nossas ações. 

      Com isso podemos concluir que viver, e saber viver, é mais uma tarefa de técnica do que a aplicação lógica de um princípio isolado, pois a vida não é constituída de uma só virtude mas de várias que não possuem princípios que sejam comuns entre si, ou seja: ao homem cabe buscar um pouco de liberdade aqui, um pouco de igualdade ali e mais afeto um pouco adiante e um pouco de tolerância em algum lugar, fazendo esta última não se esquecer da justiça que sabe discriminar de maneira intolerante o bem do mal, ou seja: não se pode fazer da vida a aplicação de um desses princípios de maneira isolada sem que a própria vida não seja ela mesma destruída por tal princípio. 

Sobre as Coisas Permanentes




   A questão relacionada à concepção do que viria a ser “natural”, ou não ser “natural”, pode parti de um ponto de vista ou de outro, é lógico. No entanto, a ideia de “natural”, como a defino aqui, não é necessariamente a de natureza biológica, pois esta noção de natureza fundida com a noção de biologia é uma criação recente do empirismo. Não possui, grosso modo, quinhentos anos.

Quando digo “natural” eu recorro a uma tradição antiga que a compreende como ordem, e de uma ordem que, no mínimo, é captada pela razão humana – já ouviu falar de “luz natural da razão”?

A natureza biológica não pode definir aqui o que viria a ser “natural”, ou “racional”, pois algumas noções de ordem não são implícitas no modo de ser de natureza, pois, por exemplo, não poderíamos retirar um modelo de família a partir dos macacos bonobos, já que estes, via de regra, cometem incestos e pedofilia. Não é deste natural que eu digo. Falo, como fala Russell Kirk, da existência de um princípio de ordem, de coisas imorredouras e permanentes, ou de uma ordem moral (no sentido de morus, ou costumes) duradoura, pois, nas palavras dele, “Essa ordem é feita para o homem e o homem é feito para ela: a natureza é uma constante, e as verdades morais são permanentes” (KIRK. Política da Prudência. p. 104).

Sendo assim, tais ordens são transcendentes no curso do tempo, são maiores do que o período de uma vida humana finita, e permanecem para muito além dela. Isso não está relacionado com religião e não depende dela, já que pode ser vista como uma constante em várias culturas. Por exemplo, a ideia de família é majoritariamente imutável em diversas culturas, e pode muito bem resistir ao tempo sem necessidade de ação humana. A ideia de hierarquia de valores, a supervalorização da vida intelectual, as hierarquias de poder, são, necessariamente, coisas indestrutíveis e permanente, e por mais que se façam arranjos isso não pode se prolongar de maneira indefinida no tempo. Uma das coisas que podemos chamar de “anti-naturais”, é, por exemplo, a tentativa de supressão da singularidade, individualidade e variedade humanas por meio da tentativa de forçar uma igualdade – seja intelectual, seja de beleza humana e até econômica – por meio da política. O programa de revolução cultural na China, por exemplo, só prova como a tentativa de estabelecer uma nivelação cultural pode ser opressor e anti-humano. Esse programa se constituiu, basicamente, da tentativa de nivelar culturalmente a população chinesa, e como elevar toda a população ao nível dos gênios se mostrou impossível, logo se tomou a via mais fácil: o governo caçou de maneira sangrenta todos os gênios e opositores da revolução (sobrando apenas aqueles pertencentes ao Partido responsável por manter a igualdade – com exceção deles mesmos) para que todos fossem UNIFORMIZADOS em suas almas, por assim dizer – o que, evidentemente, não deu certo também.

É aqui que encontramos a dignidade de uma filosofia conservadora, pois ela é a única que pode tolerar a diferença concreta no mundo, já que sabe que, historicamente, a uniformidade humana é algo materialmente e absolutamente impossível. Nesse sentido podemos afirmar que a hierarquia social e a variedade é algo INTRÍNSECO e constitutivo da própria sociedade e de grupos sociais. Todas as tentativas de suprimir isto na história em nome da paz acabou em uma violência inimaginável, sendo esta violência infinitamente superior àquela que eles diziam estar combatendo. Desta forma – e pego o historiador Niall Fergusson como referência -, existem coisas que são como leis na história, e é com base neste tipo de lei (que esta acima de toda a ideologia) que podemos, tal vez, estabelecer uma ciência – e boa ciência, aliás – do homem, ou dos homens. São coisas pequenas e cotidianas que NÃO SÃO CONSTRUÍDAS. São, aliás, CONSTANTES. Por exemplo: tenho certeza que não seria possível considerar os seis últimos mandamentos do decálogo como “socialmente construídos”, pois, do contrário, tenho absoluta certeza que se levado a execução da abolição dos seis últimos mandamentos ao nível global, é óbvio que o mundo seria imergido absolutamente no Caos informe.

Afirmo de novo, isso não é religião – ainda que estejam em muitas religiões -, mas faz parte de uma ORDEM IMORREDOURA, que transcende o limite dos séculos e dos milênios, ordenando a vida e definindo espaços de liberdade para o homem – já que a própria liberdade não é um princípio em si, pois se a liberdade fosse aplicada de maneira indefinida, ela tenderia a anular-se a si mesma, já que é óbvio que a absoluta liberdade do mais forte tenderia a anular a liberdade dos mais fracos. São estas ORDENS que são captadas pela LUZ NATURAL DA RAZÃO, e aplicadas de maneira constante na HISTÓRIA HUMANA. Não existe civilização possível sem coisas assim – Freud e Claude Lévi-Straus já afirmaram que culturas sem tabus são absolutamente inexistentes e materialmente impossíveis, e com isso é possível perceber que, sim, EXISTEM LEIS que não podem ser quebradas sem o preço vermos desmoronada a base da civilização. É isso que algumas pessoas não entendem.

Existem determinados grupos ou associações humanas que desejam ser chamado de “famílias”. No entanto a única que é uma família com dignidade acima de todos os outros arranjos, e que é feito para o homem e o homem é feito para ela, é aquela onde temos pai, mãe e filhos, já que esta constituição de família só não é possível – convenhamos – na eminência de uma tragédia, tragédia esta que DEVE ser evitada. Equalizar em dignidade este tipo de família com outros arranjos é um absurdo em si mesmo, e vai contra a razão. É, também, desumano!

Por tanto eu não estou aqui falando de leis positivas, e nem de religião, mas de conjunto de elementos intrínsecos de uma ordem natural. Não é religião, já que Platão, Aristóteles, Tomás de Aquino, Thomas Hobbes, Richard Hooker, Schelling, Kant, Edmund Russerl, Erich Voegeling, Russell Kirk etc. afirmaram a existência de “coisas permanentes” se valendo da FILOSOFIA. Para mim o conhecimento destas LEIS é a única razão, por exemplo, para se estudar história, pois é a única coisa que pode justificar a seguinte frase: “Um povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la” – e aqui obviamente no sentido dos erros, já que repetir os acertos não é mal, não é? -, pois a História busca CONSTANTES, PRINCÍPIOS, LEIS, se não não seria possível nos valer de alguma edificação pessoal ao investigar ela, e não haveria razão para tanto, já que não retiraríamos daí nenhum bem. Sendo assim, por último, esta ORDEM é a única coisa que pode salvar e justificar a RAZÃO HUMANA, pois possibilita vermos aquilo que é e aquilo que não é, discriminando uma coisa e outra.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

A Dialética e o Pensamento Perverso


      Existem alguns homens perversos que só sabem julgar em bloco. Que ficam querendo nos colar junto a alguns personagem excêntricos e histriônicos. Para mim é indiferente o que dizem os bolsonaros, os carvalhos, os azevedos da vida. A única pessoa que eu permito me representar diante de que quer que seja é este quem vos fala - pois tenho certeza que estes não tem o mínimo interesse de me representar, também -, e, diante de Deus, no juízo final, a Jesus Cristo, meu Santo Senhor.

   Eu sou o apóstolo de minhas ideias, e responsável por elas, independentemente do que dizem x ou y acerca de x ou y assuntos. Não é porque citamos algum autor ou concordamos com determinadas ideias que alguém também professa, que nós, ipsis literis, aderimos de maneira incondicional a tudo o que alguém diz ou pensa. Somente uma criança, um inepto ou quem tem sérios problemas psicológicos, mentais ou morais pode analisar discursos assim.


   Existe uma técnica que poucas pessoas conhecem, que é a técnica da dialética - ainda que ela seja a forma própria de meditação ou de qualquer investigação humana -, e que se serve de um processo de depuração de ideias, permitindo que façamos a separação científica de coisas boas das coisas ruins até chegar a um conceito ou ideia pura. Isso serve para a análise da História, das personalidades e de grupos. É o procedimento de qualquer análise científica. Nesse sentido, caro amigo, você pode até acreditar em uma ideia boa, que é também esposada - pelo menos em seu enunciado - pelo próprio Lula, ou pelo Renam Calheiros, sem necessariamente apoiar as razões perversas por meio das quais eles aderem a tal ideia, ou sem ser deixado levar pelo ardil psicológico ou pela vaga emocional com por meio das quais tais sujeitos publicam a mesma ideia. Um exemplo disso é a forma como eles apoiam a ideia de "justiça social", com a qual todas as pessoas com um mínimo de coração concordam também.


   Esse negócio de não ser possível separar a ideia do sujeito é pura falta de habilidade intelectual, ou até mesmo representa a superabundância de perversidade daqueles que sabem que podem derrubar algum desafeto por meio de associação entre ideias e pessoas, não fazendo a distinção entre ideias e pessoas, misturando uma coisa à outra, e não dando atenção ao contexto da evolução das ideias ou aos filigranas (pequenas inserções que podem modificar o sentido total de um texto). A técnica é simples: basta você encontrar enunciados ou ideias que indivíduos perversos divulgaram, e encontrar semelhanças entre esses e ideias e enunciados que algum inimigo seu também publicou - sem levar em conta o contexto, a evolução das ideias ou como elas foram aplicadas historicamente -, e pronto: você tem um falso argumento poderoso para dizer que um desafeto seu é mau, sem necessariamente dizer explicitamente que ele é mal: a própria associação da conta do recado. Qualquer um que estude retórica sabe que este ardil é extremamente utilizado em retóricas de partidos políticos, nas disputas de poder, no jornalismo, nas academias, e também nas disputas judiciais.


   No entanto eu dou uma pista para que se possa chegar a aquilo que eu tenho defendido, por hora: recorra ao que eu escrevo - o que não esta encoberto - e me pergunte pessoalmente o que eu penso sob determinados assuntos. É com isso que você encontrará "provas" contra mim. Somos indivíduos, e como indivíduos cada qual deve ser tomado como indivíduo, e não como alguém absorvido em uma massa informe de pensamentos e pessoas (o que Freud já descrevia como a característica própria de um bebê com relação a sua mãe). Já não sou mais criança para ter sobre mim tutores.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

A Experiência de Dalrymple


   O multiculturalismo tem a sua verdade no fato de que a pluralidade é um dado próprio da existência, e que diferenças devem ser toleradas por questão de necessidades de convivência entre indivíduos que, entre si, nutrem suas divergências.

   No entanto, tal como provou a história da Europa e das Américas, tal pluralidade não existe sem uma cultural a conferir uma identidade fundada em concepções filosóficas, ou naquele sentimento de comunidade e pertença por meio da qual indivíduos diferentes tenham o que partilhar. É justamente isto que confere consistência à democracia, onde a fortaleza das instituições e leis são imprescindíveis para que a "unidade na pluralidade" seja possível. Esta é a experiência por excelência do iluminismo inglês e da unidade cultural americana.

   No entanto, diante de toda esta questão relacionada à crise da imigração, segue um texto de Theodore Dalrymple (no livro "Vida na Sarjeta: o círculo vicioso da miséria moral", publicado pela É Realizações), psiquiatra e crítico cultural inglês, que descreve como é impossível a convivência entre culturas distintas sem que os indivíduos se sujeitem a leis à cultura do lugar onde decidiram morar, como se segue:

   "Como um médico que trabalha num bairro pobre com muitos imigrantes, vejo o multiculturalismo de baixo para cima e não do alto da teoria para baixo. É claro que, pelo que assisto todos os dias, nem todos os valores culturais são compatíveis ou podem ser conciliados pela enunciação de lugares-comuns. A ideia de que podemos viver todos juntos, sem a lei ter de distinguir favoravelmente um conjunto de valores culturais de outro, é mais do que simplesmente falsa, e não faz nenhum sentido.

   Deixem-me dizer, de uma vez por todas, que acredito na imigração como um fenômeno saudável, especialmente para uma nação como a Grã-Bretanha que, caso contrário, seria insular e introversa. Em geral, os imigrantes são trabalhadores incansáveis, empreendedores, e enriquecem a vida cultural - isto é, desde que não lhes deem a distinção social de vítimas ex officio e a cultura deles não seja do mesmo tipo de patrocínio condescendente com que o Estado Soviético tratava as minorias.

   Um grande número de imigrantes, de fato, consegue viver muito bem em duas culturas ao mesmo tempo: não porque alguém lhes diz para agir assim, mas porque querem e porque precisam.

   Apesar de tais sucessos, contudo, muitas vezes surgem conflitos entre indivíduos e grupos por causa de padrões culturais, crenças e expectativas diferentes. Para nós, esses conflitos podem ser resolvidos ao apelarmos para o princípio superior, profundamente arraigado na lei, de que os indivíduos tem direito (dentro de limites definidos) de escolher como viver. Essa noção ocidental de individualismo e tolerância não é, de modo algum, visto da mesma maneira em todas as culturas" (p. 50), e ainda:

   "[...] persiste o fato doloroso e inescapável de que muitos aspectos das culturas que tentam preservar são incompatíveis, não só com os costumes de uma democracia liberal, mas com os seus fundamentos jurídicos e filosóficos. Não há demonstração de preocupação ou eufemismos suficientes que possam alterar esse fato." (p.57)

   Esse texto fora escrito há exatos vinte anos, e de lá para cá muita coisa mudou, não servindo para uma análise perfeita daquilo que hoje ocorre tristemente com a Europa. No entanto ele pode ser iluminador, pois, se antes o que ocorria era terrivelmente difícil, quão difícil não será hoje onde as contradições potenciais aumentaram de maneira aterradora? Mas ele serve, no entanto, para aplicar a compreensão que nos fornece na leitura de casos no nosso país. E há, sobre isso, muito o que falar!

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Conflito de Visões


      O drama dos refugiados é, essencialmente, um terrível drama de ordem política, cultural e, sobre tudo, moral. E certamente os nossos sentimentos humanos afloram diante desta enorme catástrofe.

    É interessante notar, porém, que os países cuja religião é, fundamentalmente, a religião islâmica, se recusam terminantemente a receber seus próprios irmãos de fé. Mas a Europa é obrigada a fazê-lo e, se não fazem, são xenófobos, racistas etc.

    É óbvio que não se deve aqui julgar em bloco - algo que qualquer pessoal com dotada do mínimo de raciocínio deveria fazer -, como se todos refugiados fossem, em si, uma ameaça universal, ou que nenhuma integração ou acolhimento destes refugiados deferiam ser feitas. No entanto é impossível não considerar que esta invasão em massa não o seja uma ameaça.

   São mais de 5 milhões de refugiados, número maior do que o da Segunda Guerra Mundial; isso revela o drama terrível que esta sendo vivenciado nesses países, onde radicais islâmicos estão, em nome da "fé", promovendo uma verdadeira carnificina para a glória - ou infâmia - do Islam.

    Etnocentrismo, eurocentrismo, islamofobia? Quem são os maiores pregadores do medo ao Islam a não as lideranças do Islam? Eis uma questão que abre outra, a saber: a capacidade das culturas e dos sistemas políticos comportarem um choque cultural tão grande, assim como evitar que a própria Europa não se veja, em algum momento próximo, diante de um colapso que, em pequena escala, já podemos vislumbrar em bairros franceses, ingleses, alemães, holandeses etc.

    Aqui, também, não podemos capitular diante de um fato óbvio, que trata-se da infiltração terrorista que, mesmo em pequena escala, já se fazia presente na Europa – assim como se faz presente mesmo nos EUA e demais países da América do Sul. No início do ano, vi muitas pessoas dizerem "Je Suis Charlie", sem perceberem, hoje, que o ataque veio das raias do terrorismo islâmico. Fato óbvio que com uma imigração em massa dessas pode vir a aumentar os riscos desses atentados de maneira exponencial, cujo fator de origem cultural não pode ser ignorado jamais.

    O islam é uma religião que tem um forte apelo de vínculo, e que une culturalmente as pessoas de maneira intensa, criando redes que auxiliam no estreitamento dos vínculos afetivos e intelectuais dos integrantes, o que faz da comunidade ser facilmente tentada por propagandistas terroristas e sua visão cultural do mundo. Isso também explica o porquê que países de maioria islâmica só aceitam a Sharia (a lei islâmica), como lei que rege a vida da comunidade. Diferentemente do Ocidente que passou por reformas religiosas e políticas, e que desde sempre conseguiu uma convivência entre Deus e César, cindindo o Estado e a religião, não criando um prejuízo na essência da fé ou na comunidade religiosa que reconheceu em sua tradição que a razão natural do homem era fonte de autoridade compatível com a autoridade divina (algo que é claro em Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino, Thomas Cramer e Richard Hooker), o Islam não pode compreender o que significa a separação entre o estado e a religião, pois o Corão e as Sunas são fontes de autoridade suprema e de jurisprudência. E isto sempre foi assim: Maomé era um líder religioso e político que assumia todas as pastas.

    E isso significa mais: segundo o historiador Nial Fergusson e o psiquiatra e crítico cultural Theodore Dalrymple, o Islam se viu, por séculos, estagnado diante do progresso científico, que por sua vez encontrou amparo na cultura onde vigorava a tradição cristã. Tal como viu pensadores islâmicos - como René Guenón -, o cientificismo ocidental era puro satanismo, pois tendia colocar alguma verdade ao lado da verdade divina. No cristianismo, a capacidade de assimilação da filosofia e das ciências nunca foi vista como algo mal ou ameaçador, em essência, para a fé, mas, pelo contrário, algo natural à própria fé. Tal distinção é aquilo que provoca a cisão radical entre a visão ocidental cristã e a visão islâmica (que só consegue enxergar o Ocidente como cristianismo). Isto torna inconfundível a percepção de que tais movimentos jihadistas na era contemporânea tem um sabor de messianismo e de serviço sagrado. Algo relacionado com a salvação da humanidade das garras do Grande Satã - tal como os EUA são vistos por países muçulmanos e mesmo por socialistas, marxistas, maoístas, leninistas, trotskystas etc.

    Com todos esses fatos, cabe-nos considerar as suas implicações no período moderno diante de um Islam que tende a ser inflexivelmente reativo às questões que foram postas pelo iluminismo - na esfera política, científica e filosófica -, não podendo assimilar as suas exigências sem prejuízo e sem a ruína da própria fé.

    Enfim, que o Islam vive hoje é de um período de agonia e de desespero de auto-percepção que sempre desencadeia atitudes altamente violentas diante de suas supostas ameaças. E juntamente com isso, frente ao drama humanitário a ser resolvido na integração dos refugiados, cabe-nos considerar quais as consequências que teremos desta imigração em massa (evidentemente proposital por parte dos terroristas), cujas origens são países islâmicos destruídos por islâmicos, e cuja dificuldade de adaptação às demandas do Ocidente já se demonstraram por demais óbvias.

A Crise do Feminismo



   O feminismo em sua origem demanda uma diferenciação de espécies dentro do gênero humano por causa de um raciocínio muito simples: a ideia de espécies MACHO e FÊMEA dentro do pensamento feminista é necessária para a estrutura de sua ideologia já que o MACHO é, dentro da teoria sexista, o opressor da FÊMEA.

   No entanto aquilo que se tornou IDEOLOGIA DE GÊNERO dentro do próprio pensamento feminista tende a anular a premissa fundamental de luta contra a “opressão feminina”, já que a premissa fundamental que embasa o sexismo é que existem as espécies “MACHO e FÊMEA”, e que a fêmea é explorada pelo macho; e se a filosofia feminista de hoje defende que tais espécies inexistem, logo a tese de que o macho explora a fêmea também não existe, o que seria, na verdade, apenas uma exploração interna do GÊNERO HUMANO e não de ESPÉCIES dentro do GÊNERO, já que ESPÉCIES (como MACHO e FÊMEA), segundo a IDEOLOGIA DE GÊNERO são “socialmente construídas”, sem um fundamento na realidade.

   Isto leva a crer que não importa quem esteja no topo da estrutura de poder, se são homens ou mulheres, pois basicamente “homens e mulheres” não existem enquanto espécies, mas sim enquanto entidades dentro do GÊNERO humano. Seria possível, no mínimo, defender uma ideia de luta de classes, mas jamais uma luta sexista dentro da ideologia de gênero, pois a ideologia de gênero anula automaticamente o sexismo ao proclamar a sua ideia, o que faz com que a filosofia feminista entre em uma crise insolúvel, já que não parte de uma continuidade lógica, o que seria basicamente o pecado original das filosofias hoje existentes.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Thomas Hobbes, a Paz e a Ordem


   
Eis uma ideia fundamental que guia a minha compreensão acerca do ser humano: o homem natural (compreendendo por "natureza" algo relativo à existência do ser humano com as suas pulsões, ódios e propensão animalesca, mesclada ambiguamente com a racionalidade e dimensão metafísica) deve viver guiado por leis, códigos sociais etc., para que haja a possibilidade de civilização - como diria Freud: a repressão das pulsões, a criação de tabus e normas sociais é aquilo que retirou o ser humano do estado de animalidade.

Mas seguindo esta ideia, vejamos o que diz Thomas Hobbes, contrariando a teoria romântica de Jean-Jacques Rousseau que exaltava o "homem" natural, aquele que em seu estado pré-contratual é alguém puro, sendo maculado apenas por causa da vida em sociedade (a vida prós-contratual):

"A lei natural (lex naturalis) é a norma ou regra geral estabelecida que proíbe o ser humano agir de forma a destruir a sua vida, ou privar-se dos meios necessários a sua preservação. [...]

Da lei fundamental da Natureza [aqui no sentido de natureza enquanto metafísica, ou seja: da finalidade inerente à natureza das coisas cujo objetivo último é o Bem], que ordena aos homens que procure a paz, deriva esta segunda lei: o homem deve concordar com a renúncia a seus direitos sobre todas as coisas, contentando-se com a mesma liberdade que permite aos demais, na medida em que considerar tal decisão necessária para a manutenção da paz e de sua própria defesa. Se cada qual fizer tudo aquilo a que tem direito, reinará a guerra entre os homens." (HOBBES, Thomas. O Leviatã: Ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. p. 111, 112)

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Cultura, por Roger Scruton

   

   Assim como os costumes emergem, ao longo do tempo, de inúmeros esforços de seres humanos para coordenar a conduta, o mesmo acontece com as tradições, que nascem das discussões, alusões e comparações com as quais as pessoas preenchem as horas livres [aqui no sentido de ocupação com a faculdade do raciocínio, segundo o pensamento de Aristóteles]. Uma cultura é uma maneira de transmitir, de geração para geração, o hábito do juízo. Esse hábito de julgamento é vital para o desenvolvimento moral e é o fundamento dos ritos de passagem pelos quais os jovens deixam a fase de adolescência e assumem obrigações na vida adulta. Por isso, uma sociedade sadia requer uma cultura sadia, e assim o é, mesmo que a cultura, como a defino, não seja fruída por muitos, mas por poucos. (SCRUTON, Roger. Como Ser um Conservador. p. 230)

A Prisão de Ferro

   A ideia do "sócio-construtivismo", herdeiro do "materialismo-histórico" é interessante. Trata-se daquela sabedoria esquisita que afirma que a sociedade e as suas estruturas formam o caráter do indivíduo. Sendo assim nunca, dentro desta teoria, o indivíduo tem, por exemplo, culpa de seu mau caráter, ou culpa por seus crimes, vícios e frustrações. Tais defeitos se devem à sociedade "opressora", "machista" etc. No fundo trata-se de uma "desculpologia" barata sem visão de alcance.

Mas - interessante - ela não pode explicar o progresso histórico por esta "teoria", já que se as estruturas sociais exteriores são responsáveis pelas realidades interiores do indivíduo, seria difícil explicar, por exemplo, a razão pela qual o ser humano teria saído da caverna.

Mas os "progressistas" armados com a visão cega do "progresso histórico" de Marx, tentam remendar a fraude: creem com fé inabalável em uma certa evolução histórica inevitável que exclui literalmente a ação humana no processo da construção do que quer que seja. Trata-se, por tanto, de um fé em uma força mística e impessoal a guiar tudo, diante da qual - se conclui -, seria necessário apenas sentar na calçada e esperar a banda passas. Os esforços pessoais, ou as monstruosas energias gastas ao longo de uma vida em nome de qualquer coisas seriam, aqui, equivalentes ao suspiro de uma pulga.

Mas toda essa inexorabilidade (ou, de maneira mais simples, a inevitabilidade) histórica não estaria completa na justificação do progresso se não fosse a visão do determinismo biológico que, desde Darwin - em quem Marx se inspirou em sua teoria materialista -, apostou em um Design Inteligente, que, segundo Darwin, tratava-se de uma "lei impressa por Deus na natureza humana". Por tanto a natureza evoluiria com base em uma razão a guiar uma finalidade para onde evoluiria. Mas o evolucionismo se pensarmos em termos de ética se torna complicado, pois subdividiria a humanidade em casatas sem fim e, seguindo a ideia da sobrevivência do mais forte ou mais apto, daria vazão a teorias racistas que dominaram a mente europeia (e Nazista, mais especificamente) e norte-americana. E era justamente tendo em vista esta visão que Marx chegara a apontar que a revolução se faria em países mais avançados, assim como condenado eslavos como povos menos "evoluídos" - destinados a perecer no holocausto revolucionário - e o lumpen (a casta de vadios, deficientes físicos e mentais, bêbados, prostitutas, viciados dos mais diversos, ou seja: todos aqueles incapazes de produzir ou contribuir para a sociedade igualitária), já que não haviam atingido o progresso necessário que daria existência à calasse proletária revolucionária.

Nesta vaga, o caminho aberto para a destruição de conceitos como consciência individual e responsabilidade pessoal são destruídos. E não é preciso pensar muito para descobrir que se somos condicionados apenas pelo meio em que vivemos, a ideia de que o ser humano seja livre para decidir, sem de antemão estar predeterminado a uma escolha correspondente à uma estrutura à qual ele já esta condicionado, é, nó mínimo, impossível. Abre-se, a partir deste pensamento, toda uma corrente que tende a afirmar que "o ser humano nasce bom, mas é corrompido pela sociedade" ou "pelo seu código genético". Abre-se, no fim, toda um catálogo inumerável de desculpas que retira do ser humano a possibilidade da liberdade, condenando-o previamente a viver em um ciclo vicioso impossível de ser rompido, ou a guetos sem vistas para os céus e que não deixa a mera possibilidade de ele elevar o espírito e emoções a lugares altos onde ele pode se demorar, contemplando aquela beleza que só pode nascer em um espírito livre, possibilitando carregar consigo um poder que traz um pouco de luminosidade neste mundo de trevas.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Revolução ou Gratidão


   Todas as vezes que eu ouço alguém proclamar um "novo mundo" eu fico cá a pensar em tantos outros que no passado já pensaram assim. 

   Talvez a história do "novo mundo" não seja tão nova quanto todos pensamos, mas quem fala de "novo mundo" se referindo às próprias ideias, na esmagadora maioria das vezes só deseja infundir um determinado charme a si mesmo, e não raro acaba desprezando toda a boa vontade de um passado do qual é filho.  

   É essa a soberba que acaba caracterizando aqueles que proclamam a própria originalidade, e que enxergam o passado somente como algo a ser superado, o futuro a ser unicamente construído e no presente nada a ser conservado. 

   Tal vez isto tudo reflita um pouco o pensamento de Mikhail Bakunin, que se achava tão corrompido pela sociedade que, não obstante acreditar em um futuro melhor, enxergava tudo o que existia a sua frente como algo a ser destruído, e nada a ser construído, pois não conseguia sentir reverência por nada daquilo que o cercava. 

   Pensando em tudo isso posso chegar a imaginar que a razão do ódio contido em um projeto de revolução permanente reside justamente na incapacidade que as pessoas possuem hoje em dia de sentir um pouco de reverência e gratidão. E se olharmos para qualquer canto não nos faltará motivos para reverenciar e agradecer. 

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Os Problemas e o Mundo


   Existem determinados problemas cuja atitude mais urgente que devemos ter para com eles é não lhes dar tamanha importância. Tal vez seja esta a consolação de não termos o poder de dobrar o mundo com as nossas mãos. 

   Existem preocupações que não passam do reflexo, ou da soberba interior, ou de uma total desordem na percepção das nossas forças com relação ao tamanho dos problemas do mundo. 

   Mal damos conta de arrumar o nosso quarto, ou a nossa dispensa, mas existem pessoas que acreditam ter nas mãos não de poder mudar o mundo, mas - o que é pior - de extingui-lo e de criar um outro melhor. A palavra loucura não da conta de nisso estabelecer uma definição.  


sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Um Pouco de Russell Kirk


"A atitude política e moral chamada conservadorismo não vem de um livo; de fato, algumas das pessoas mais conservadoras que conheci eram distintamente avessas a livros. As fontes da ordem conservadora não são escritos teóricos, mas, em vez disso, o costume, a convenção e a continuidade. Edmund Burke (1729 - 1797) não conseguia imaginar nada mais perverso do que a alma de um "metafísico abstrato" em política - isso é, um tolo ou um velhaco erudito que imagina poder varrer as complexas instituições de uma sociedade civilizada, penosamente desenvolvidas ao longo dos séculos de experiência histórica, para pôr-lhes no lugar algum projeto livresco de um paraíso terrestre de própria autoria. Por tanto, não existe um equivalente conservador do Das Kapital" [O Capital] de Karl Marx (1818-1889); e, se Deus quiser, nunca existirá." (KIRK, Russell. A Política da Prudência. p. 129)

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Valor e Preço


  Existem coisas que possuem valor, mas que não possuem preço. Um exemplo bem claro disso é uma história recente das relações da China com o Sudão, país que à época abrigava uma guerra civil que acabou eliminando mais de 500 mil pessoas.


   Quando um ministro chinês fora indagado sobre a razão pela qual o seu país continuava a ter relações comerciais irrestritas com o Sudão, ainda que estivesse ocorrendo uma guerra civil onde a covardia incidia por parte dos governantes naquele país, o ministro chinês simplesmente respondeu: "negócios são negócios".


   Por isso: eliminar as travas dos valores (o lócus privilegiado das religiões e dos costumes, por exemplo) é dar livre curso à revolução da morte - e isso não tem preço que pague, pois é caro demais. 

O Dogma do Pecado

   

   Algo maravilhoso da fé cristã é a sua mensagem concreta como uma pedra. Muitos podem ver o dogma cristão sobre o pecado como uma "mistificação ultrapassada", no entanto esta visão das coisas não pode se sustentar diante de um exame honesto de consciência.


   Qualquer um teria vergonha de ter os seus pensamentos publicados como um filme, e tal vergonha sinaliza um erro fundamental no homem; este é um erro que em um passado não tão distante foi maquiado com a palavra "limitação". A palavra "limitação" pode ser falsa, pois, por exemplo, podemos afirmar que somos indivíduos limitados por não podermos voar, mas ninguém diria em sã consciência que a incapacidade de voar seja um pecado. 

   A palavra pecado requer uma consideração mais profunda e mais séria, pois ela traz a tona uma ideia que não é confortável, mas nem por isso mentirosa, já que pecado é justamente o que há pior no ser humano. No fundo uma revolta, uma obstinação, uma vergonha, algo que humilha qualquer qualquer auto-imagem enganosa - o que não é, no fim das contas, agradável. 

   No entanto isto não é algo que atinge um ou outro distante, mas é partilhado de maneira, digamos, democrática. O pecado é democrático, mas também é totalitário: iguala todos a uma condição determinada, e não permite que se possa viver sem que ele não esteja à espreita. Mas é mais do que isto: está incrustado na natureza humana. 

   Se há algo pode humilhar a vaidade humana, e derrubar o trono sobre o qual fomos colocados pela nossa vaidade, não se trata das virtudes que nos unem - unem alguns poucos homens, aliás - tanto quanto os defeitos que nos perseguem, e isto é mais concreto do que o pensamento lisonjeio de que a "humanidade nasce boa", mas é corrompida pela "sociedade". O pecado é um defeito ontológico, ou, de maneira mais simples, um defeito no ser do homem.

   Como dizia G. K. Chesterton, falando sobre o dogma do pecado original, alguns poderosos podem ser imprescindíveis para a existência da sociedade como queremos e necessitamos, mas para um cristão isto nunca quis dizer que tais indivíduos poderosos fossem bons em si mesmos. Pelo contrário, o dogma do pecado é o único que pôde nos livrar do poder da tirania, já que uma desconfiança sobre a natureza humana é algo que sempre fez morada em nosso pensamento - o pensamento cristão. 

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Desespiritualização e Teocratização Paralelas: O Conservadorismo como Melhor Resposta


   O irônico é que inúmeros defensores de Teologia Política - que eles ensaiam esvaziando tudo daquilo que existe de sagrado na Teologia, fazendo uma verdadeira politização da teologia, transformando Marx em teólogo, ou mesmo a escola de Frankfurt em legisladores do Juízo Final - detestam quando, ao menos, uma pessoa confessamente religiosa - grosso modo, hoje em dia, aqueles da ala evangelical - entram no campo da política. 

   É interessante que tais indivíduos negam a existência de determinados conteúdos nas camadas mais sutis da própria consciência, ao chamar de fundamentalista o "Outro", porque, neste caso, o "Outro" não pode exercer a Teologia Política que não seja a deles próprios. 

   O problema dos "Teólogos Políticos" não é, desde a ideia da escola alemã de demitologização, nada além do que o esvaziamento teológico, fazendo, com a nova ideia de "teopolítica" que culminou nos movimentos de esperança na década de 1960 na Europa, e na Teologia da Libertação aqui na America Latina, um prosélito ao contrário: ao invés de teologizar a visão excessivamente pobre e extremamente horizontal e política do homem, para que ele possa se dedicar à aquilo que importa e que não lhe será tirado, eles politizam a teologia, transformando Igrejas e ministros religiosos em cabos eleitorais. Por último, para o lixo com a transcendência, salvação, alma, moral - pois, neste âmbito, tais conceitos são formas míticas de representar nuances psicológicas ou de intuições sobre formas sensatas de relacionamento em sociedade (não entrarei aqui no conceito errado de mito que hoje em dia contamina as mentalidades)! No entanto, tais "teólogos políticos" odeiam com ódio visceral qualquer um que procura teologizar a política fora deste tipo de espectro (já que a Teologia da Libertação é a única que possui o monopólio da ação política teologizada aqui no Brasil) - o que, de fato, é uma metástase daquela confusão de pensamento que eles próprios criaram.  

   Para deixar claro, a política está, para a vida cristã, em uma esfera distinta da esfera teológica. A teologia pode oferecer a fundamentação moral de ação do homem político, mas escapa à própria política aquilo a que o próprio cristianismo oferece: a redenção do homem. Política é serviço, no sentido mais pleno do termo, como aquilo que diz respeito aos interesses da pólis - e isto implica (como nos mostra Aristóteles em "Ética a Nicômaco") no mais alto preparo moral do homem político. Por tanto, trata-se de uma vocação de serviço, que ainda que sujeita ao agente político, guarda ela a sua própria natureza de disposição em favor da pólis - e aqui fazemos uma divisa de Weber, que distingue a ética da responsabilidade e a ética da convicção, visto ser a primeira prudente na institucionalização dos conflitos, e na mediação das diferenças sociais ou religiosas, e a segunda compreendida como ética radical, fundada em valores profundos, como valores religiosos, filosóficos etc - tal como nós absorvemos na melhor tradição política ocidental. 

   No entanto, o que deve ficar claro é isto: 1) A retórica de determinados "teólogos políticos", que, não menos radicais que determinados fundamentalistas, busca esvaziar a teologia de seu conteúdo transcendente (ou espiritual), transformando Igrejas e ministros em megafones de partido; 2) A criação de uma determinada teocratização da política, o que guarda uma identidade, em seus métodos, com o primeiro item, gerando fundamentalismos desnecessários; 3) A necessidade de recorrer ao melhor da tradição política do Ocidente que, grosso modo, não exclui a identidade - até mesmo a identidade religiosa - popular, respeitando as tradições sedimentadas ao longo dos séculos, e procura, a partir de um Estado não confessional (ou leigo), mediar conflitos, e atuar a serviço dos interesses da nação, e não de partidos, ou de utopias políticas, voltando o olhar para as necessidades concretas, e primando pelas liberdades individuais a partir de nossas próprias referências históricas e necessidades humanas.