quinta-feira, 2 de junho de 2016

Notas Sobre o Respeito à Opinião



   Você pode respeitar o direito do outro ter uma opinião que não a sua. Mas dizer que se é obrigado a respeitar as opiniões de maneira incondicional é um truque, um negócio meio louco, e uma exigência estritamente desonesta, no fim das contas - coisa que existe apenas para Deus (que sempre está certo) e em ditaduras, onde a ideia do mais forte (o ditador) deve ser respeitada a todo custo. Essas coisas são calaras também nos seguintes casos: não podemos respeitar a ideia de um genocida; de um trapaceiro ou de um sabotador que, com ares de bondade, busca subverter as coisas por dentro se fingindo de amigo e colaborador; e muito menos devemos respeitar aquelas ideias cuja bondade está exposta apenas no enunciado da ideia, na proposição, mas que são desastrosas quando colocadas em prática. É claro, qualquer indivíduo que busca ter uma opinião - já que ter opinião para tudo é falta de bom senso - deve, para isso, estudar os fundamentos da sua própria opinião, não sendo irresponsável para divulgar a esmo aquilo que não sabe. Mas o que devemos fazer? Devemos medir o grau da coisa, e, entre outras coisas, compreender que uma opinião não é uma pessoa. Uma opinião podemos jogar no lixo; uma pessoa devemos procurar amar - e, se possível, livrar esta pessoas de ideias que irão destruí-las e destruir outros. Penso que é por aí que são consideradas as coisas.

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   Chegamos a um período de inversão louca: antes desrespeitávamos ideias, mas reconhecíamos por traz delas uma pessoa que geralmente era superior às ideias mesmas; hoje se força a respeitar a todo custo uma ideia divergente, mas em troca se desconsidera com isso em sua totalidade as pessoas. Isso ocorre porque o "respeito às ideias", sejam elas quais forem, eleva ao grau de dignidade as concepções de mundo mais loucas, foçando todos a lidarem com elas com ares de respeitabilidade, exigindo, de quebra, que todos se portem com base em um fingimento imposto pela regra do "respeito", o que, como diria C. S. Lewis, acabava por formar homens sem peito. Sou mais adepto do método de discussão ao modo dos monges medievais, os quais entravam em uma espécie de "delirium tremendum" no momento da defesa de suas teses, mas que conseguiram manter unido um continente por um período de mil anos. Foi quando as boas regras de refinamento burguês entraram em jogo que deu-se o início ao império do fingimento. Por tanto o cacoete de bom-mocismo de "respeito à opinião do outro" é puro fingimento burguês. O máximo saudável é respeitar o direito do outro de ter uma opinião, e não o de respeito irrestrito à opinião, pois no caminho dos mais entendidos há a compreensão de que é apenas o tolo que respeita incondicionalmente A opinião em si, seja a sua mesma, seja a de um outro.

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   Nenhuma opinião é desinteressante em si. Elas podem curar ou matar, fazer viver ou deixar perecer. Neste campo não existem trivialidades, pois uma ideia, por mais tola que seja (e justamente por ser tola que deve ser considerada perigosa), pode fazer errar uma vida por toda a vida. No mundo das opiniões não há reclamação de inocência. E neste campo, calar frente à incerteza é amar o próximo. Tão tolo quanto quem não sabe o que fala é quem decide disciplinar com clichês o debate com regras que militam contra a razão, sendo um destes clichês o afamado "respeito à opinião". Bem, se refletirmos bem o que significa isso chegaremos à descoberta que trata-se de uma regra imoral. A ideia de "respeito à opinião" nasce da má compreensão sobre a liberdade de expressão. É um filho bastardo e sem herança de tal ideia. No mundo ocidental, segundo o free speech, a ideia nada mais significa do que o direito garantido pela constituição de alguém não ser morto por causa de proclamar um pensamento divergente. Mas é claro que ainda assim isso não significa que eu possa pregar o genocídio de judeus, por exemplo, pois há limites claros entre o free speech e a apologia ao crime. Por tanto não se trata de "respeito à opinião", mas de resguardar o indivíduo que opina do rancor das massas, do grupo divergente ou daquele que pensa o contrário. Mas notem que o que se quer passar por pensamento livre com a ideia de "respeito à opinião" é o fim de toda a divergência e livre opinião, pois respeito tem-se daquilo sobre o qual concordamos e qualquer concordância é, também, uma discordância do contrário, um desrespeito - por assim dizer - daquilo sobre o qual não concordamos por concordar com outra coisa (é necessário decidir). Por isso é forçoso concluir que a própria ideia de "respeito à opinião" nada mais é do que a manifestação de uma ira contra a realidade, um desejo de eliminação da divergência – sem a qual o raciocínio para o próprio indivíduo, no processo meditativo, é impossível, pois precisa comparar ideias contrárias, confrontando-as - e algo que só pode culminar na própria destruição do pensamento e de todo o raciocínio livre, visto que se eu sou obrigado a respeitar a opinião divergente não é possível discordar, pois discordar (palavra que se relaciona com discórdia) é, no fundo, não respeitar a opinião (ainda que devamos amar os indivíduos e às vezes discordar deles por amá-los). Em fim, a má ideia sobre o "respeito à opinião" é o caminho para a destruição e supressão dos indivíduos pensantes, pois todo o pensamento está ligado inevitavelmente sobre algo que reflete. 

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