sexta-feira, 28 de junho de 2019

Immanuel Kant, a Razão Prática e a Fundamentação do Direito

   Uma das coisas que é possível entender lendo o "Metafísica dos Costumes" de Kant é o nível de asnice que se diz sobre o velhinho corcunda de Königsberg - aquele que pela regularidade de suas caminhadas servia de media para que as senhoras prussianas acertassem seus relógios.
   A primeira coisa que sempre que vejo alguém com tinos medievais, quase que munido com vestais de ferro, lançar contra o homem é a acusação de que a doutrina liberal dele é derivada. É correto afirmar isso, mas não no sentido daquela formulação que encontra habitat seguro nesse tipo de cabeça, aí se reproduzindo sem peias morais com outras ideias tão estranhas e assanhadas quanto, pois se busca aí derivar do "liberalismo kantiano" tudo aquilo que veio a ser mal no mundo moderno.
   Uma das coisas que vi recentemente, e que veio de um ser chamado Carlos Ramalhete, foi que a consideração da doutrina moral de Kant se referia apenas à execução de uma lei exterior, o que seria o mesmo de afirmar aquilo que dizemos por "cumprir a lei pela lei". Ao contrário disso Kant diz que todo o direito positivo, ou toda lei positivada na constituição de um país (lei empírica), é meramente oca como uma cabeça sem cérebro, se tal lei ou constituição não encontra anteparo ou sustentação em uma lei reconhecida a priori pela razão, cujos princípios devem ser reconhecidos independentemente de toda a recorrência à sensibilidade como móbile da ação - como o prazer e o desprazer (e essa irrecorrência é característa daquilo que se convencionou chamar de direito natural ou ius naturale).
   E é interessante notar que Kant deriva toda a doutrina do direito não do universo teórico, ou de uma "metafísica da ciência da natureza", mas sim do universo da razão prática que admite como postulado da moralidade tanto a imortalidade da alma como a existência de Deus.
   Antes de se achar a fundamentação do liberalismo kantiano como licença para a confecção de uma lei imoral e contrária à razão, Kant afirma categoricamente, e isso como fundamento da consideração de tudo o que pode ser determinado como direito, o seguinte: "É correta toda ação que permite, ou cuja máxima permite, à liberdade do arbítrio, de cada um coexistir com a liberdade de todos segundo uma lei universal"; ou: "A lei universal do direito - 'aja externamente de tal modo que o uso livre do seu arbítrio possa coexistir com a liberdade de cada um segundo uma lei universal' - é realmente, por tanto, uma lei que me impõe uma obrigação".

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