domingo, 20 de junho de 2021

Aristóteles e o Conhecimento Indireto da Matéria-Prima

É muito comum e difundida a afirmação de que, no que diz respeito ao conhecimento natural, Deus só se conhece indiretamente. E entre as vias pelas quais tomamos ciência de que Deus é está a via da analogia entis, a qual pelo caminho da eminência vamos elevando a mente até à noção de Deus a partir da percepção da gradação de perfeição dos entes.

Contudo, essa verdade não diz respeito apenas a Deus, mas, ainda que por via inversa, indo dos entes ontologicamente superiores aos ínfimos, também ao conhecimento da matéria-pura, a "prima-mater" ou a hylē, como a chamavam os gregos.

Na "Física" I.7 Aristóteles afirma categoricamente que "No que diz respeito à natureza subjacente (hypokeiméne physis), ela é cognoscível por analogia". O que ele quer dizer é que tal natureza subjacente, como é algo indeterminado (não marcado nem mesmo pela acidentalidade pela qual tomamos nota da realidade da substância) e pura potencialidade, não é diretamente perceptível, e isso por várias razões.

É importante compreender aqui que qualquer objeto material só é perceptível para nós porque atualizado pela forma. É por isso que percebemos a matéria apenas naquele e neste objeto atual, e não naquilo que a "prima-mater" (hylē) é em si mesma. E isso é assim porque mesmo os nossos sentidos (audição, visão etc.) só se tornam ativos quando movidos por determinada forma que leva tais sentidos ao ato da percepção (uma potencialidade pura nada leva a ato).

Isso explica o porquê a matéria pura, como sendo potencialidade pura, e não atualizada por qualquer forma, não pode mover os nossos sentidos, não podendo, por tanto, ser diretamente perceptível por nenhum deles, só sendo cognoscível quando analogada àquele ou a este objeto sensível, pois sendo atualizada pela forma, pode pela forma levar os nossos sentidos a ato.

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