sexta-feira, 10 de setembro de 2021

A Mística, o Nada e a Justificação

     Há algo na linguagem sobre a fé que consta na tradição luterana, e que surge da influência que o misticismo alemão exerceu sobre essa tradição, que é algo maravilhoso. Assim se diz que a "fé é nada", e é por esse processo de nadificação do homem que ele pode receber sobre si a justiça de Deus, que é "iustitia aliena" (justiça de outro), não justiça própria. Assim se nega que o ato da fé seja computado meritoriamente para a salvação, mesmo que seja o maior dos atos morais entre os homens no curso da história - e mesmo nessa esteira Calvino nega algo que certos escolásticos diziam, ou seja, que a fé é uma conjectura moral (suficiente para a salvação). Por isso a fé é o nada no qual Deus faz algo, pois Deus salva o homem, fazendo-o nova criatura tal como Deus fez no ato da criação, criando o mundo ex nihilo (a partir do nada). A fé é o meio da recepção da graça, e sua presença na realização da justificação é uma presença absolutamente passiva como canal pelo qual a graça flui para o pecador. Aqui se compreende bem melhor o que seria a justificação em sua linguagem correta na ortodoxia protestante: a justificação é pela graça, mediante a fé e não apenas "pela fé". Assim nem o ato de crer é computado, pois não é a "fé" que justifica, mas apenas a graça de Deus que nos outorga a justificação, pois ao fim e ao cabo Deus nos salva apenas por amor a Cristo.

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