segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Criados à Imagem de Deus

    Karl Barth (1886-1968 d.C.), pastor e teólogo da Igreja Reformada Suíça, costumava dizer que a verdadeira imagem de Deus é aquela que podemos visualizar na pessoa, vida e obras de Jesus Cristo, aquele que ele nomeou de Homem Novo. Sua afirmação lança uma luz importante sobre a nossa compreensão de imagem de Deus, fazendo com que ela não se torne refém de certo tipo de reducionismo que é comum a uma leitura desatenta ou enviesada da escritura sagrada. Assim por imagem de Deus não queremos apontar meramente para o aspecto físico do homem, muito embora o corpo humano seja aquele preparado para a grandeza da função como imagem de Deus. Também não queremos nos ater apenas à espiritualidade do homem, ou seja, no fato de o homem ser dotado de uma parte imaterial que seria a sede da razão (o νους, tal como chama Paulo), das decisões (aquilo que também chamamos de coração) e assim das potências culturais pelas quais o homem realiza todas as suas obras no mundo, incluindo a religião, direito, ciência, coisas às quais só o homem é capaz.

    Nessa última caracterização, ou seja, aquela que aponta para a espiritualidade do homem, vários pensadores cristãos ancoraram a sua definição de imagem de Deus. Essa afirmação não está errada, pois a Escritura mesma afirma que Deus é espírito (Jo 4.24), no sentido bem específico que aponta a sua vida como dotada de vontade e razão (não necessariamente de um corpo, já que a nossa corporalidade é comum até mesmo aos animais, comunidade que não é verificável quando apontamos para a razão). Mas Barth quer dar um passo além, ressignificando à luz do evangelho a passagem de Gn 1.26, apontando para o que seria a verdadeira realização da imagem de Deus em sentido absoluto. Nesse sentido específico Cristo é aquele que, dentre todos os homens, porta com maior grau de excelência a imagem de Deus propriamente dita, pois quem o vê, vê Pai que o enviou (Jo 14.10).

    Orígenes (185-253 d.C.) em sua obra Contra Celso, escrita para refutar pesadas acusações contra os cristãos escritas pelo filósofo pagão que dá nome à obra, explicou que a pobreza artística do culto cristão – i.e., pobreza que significava um culto não dotado de imagens e outras artes – se devia, entrou outras coisas, ao fato de que as únicas imagens que Deus se agrada são aquelas delineadas pelo Logos (Jesus Cristo) na alma do homem, e que tais imagens eram as virtudes divinas em nós. Nesse mesmo sentido Karl Barth designa a imagem de Deus como Cristo, e podemos compreender isso em função da sua santidade, justiça, bondade, misericórdia, fidelidade e amor devotado a Deus e aos homens. Assim, lembremos que o homem foi criado santo, perdendo seu grau máximo de semelhança com Deus quando decidiu pecar contra Ele. E é Cristo, em sua obra de redenção, que pode recriar em nós, como o primogênito entre muitos irmãos, a imagem de Deus à qual nele fomos predestinados (Rm 8.30), pois em Jesus portaremos a sua imagem e realizaremos assim o verdadeiro propósito divino de Gn 1.26 de sermos criados à imagem e semelhança do Senhor.

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