segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

O Examerão

  O termo “Examerão” vem do grego Ἑξαήμερος (Exaēmeros), palavra formada por dois outros termos, que são: ‘εξα (hexa = seis) + ημερα (ēmera = dia), se referindo aos Seis Dias da Criação (Gn 1-2). O termo também se refere ao gênero literário que diz respeito aos abundantes comentários a Gn 1-2 feitos pelos primeiros cristãos. Entre os comentários famosos da antiguidade estão o Examerão de Basílio Magno (330-379 d.C.), Ambrósio de Milão (340-397 d.C.), e o de Agostinho de Hipona (354-430 d.C.), sendo esse tipo de comentário famoso durante a Idade Média. Mas algo que podemos destacar nesses comentários, a exemplo de Ambrósio, é a tentativa de estabelecer uma compreensão bíblica e cristã a respeito da origem de todas as coisas em contraste com a visão dos filósofos pagãos.

As obras de pagãos como Platão ou Aristóteles exerciam imensa influência popular, mesmo que o povo não tivesse consciência disso. Mas essas obras tinham em comum a visão religiosa dos gregos, levando em consideração que o mundo antigo (no território do Império Romano onde floresceu primeiramente o cristianismo) foi dominado pela cultura grega. Nessas obras uma coisa estava bem estabelecida: a crença comum na eternidade do mundo. Ambrósio, logo no início do seu comentário ao Gênesis, indica que os platônicos criam em três princípios, todos eles eternos: a mantéria (‘υλη = ‘ylē), a forma (ειδος = eidos – também compreendida como idéia) = e o deus (Δημιουργος = Dēmiurgos). Assim o deus não é o Criador da bíblia, mas com base nas formas eternas age moldando a matéria, dando forma ao mundo como conhecemos – mundo que se desfará e tornará a ser moldado pelo deus. A diferença com o pensamento cristão é que para nós só Deus é eterno, sendo a forma das coisas algo que está em de Deus desde toda eternidade, assim como o princípio da matéria.

O novo do pensamento cristão é que aqui o mundo deixou de ser um deus ao lado de Deus, como de resto a divinização do mundo era a conclusão lógica do mundo pagão. Fazendo isso os cristãos libertavam o pensamento de várias superstições e erros sobre a nossa relação com o mundo, com os homens e com os poderes do mundo. Mas é interessante notar que esse pensamento antigo sobre a eternidade da matéria como certo princípio separado, ou mesmo da matéria atualizada como mundo, é algo análogo a várias teorias científicas modernas. Desta forma podemos concluir com o autor de eclesiastes que “nada há de novo debaixo do Sol” (Ecl 1.9), e que o que é já foi, e aquilo que há de ser também já foi (Ecl 3.15), e tal como os cristãos antigos hoje ainda proclamamos que só há um princípio eterno de todas as coisas, conhecimento esse que é um princípio da reta compreensão do homem tal como encontramos na nossa Escritura Sagrada.

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