segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

O Constitutivo do Mal

    Na devocional passada tocamos em um aspecto importante sobre o quid (quê), a razão da tentação em relação a nós. Ali vimos que a tentação estava no fato de o homem querer ser deus para si. Essa pergunta também nos leva a outra, que é: O que é o mal? Essa pergunta não tem a intenção de explorar qualquer forma de mal, como seria a perda da forma de uma coisa qualquer, o que a conduziria à destruição – ex.: uma fruta que perde a sua forma e qualidade, vindo ao apodrecimento, é destruída nessa perda de sua forma original. O mal que nos importa é aquele ligado àquilo que diz respeito àquilo que chamamos de mal moral. Não se trata apenas de um mal com aspecto negativo, como a perda da forma das coisas – no nosso caso uma laceração, uma doença ou a morte -, mas também como um aspecto positivo no sentido de uma transgressão frontal contra Deus.

Nesse sentido a Queda é causada por essa transgressão frontal em seu aspecto positivo, o que acarretou na perda do bem sobrenatural, da justiça e integridade, além da perda da imoralidade – o que configura o aspecto negativo dessa perda. Agostinho de Hipona foi um dos cristãos que primeiramente se debruçou de forma profunda sobre onde estaria a causa da Queda. No livro A Cidade de Deus ele propõe um dilema interessante, fazendo a pergunta se foi o ato de comer o fruto proibido ou se foi a intenção anterior ao ato o que constituiu a razão da Queda. Certamente que segundo o Sermão da Montanha um simples olhar com intenção impura uma mulher é comparado ao próprio adultério (Mt 5.28), assim a intenção impura já é uma forma de degradação corruptora, pois do coração procedem as fontes da vida (Pv 4.23), ou seja, se a fonte é má os atos também serão.

A intenção corruptora está no seu desejo de fazer o mal. Assim, aquilo que para nós constitui o mal pode estar bem antes do ato, se tratando de um desejo desafiador contra a ordem divina que não precisa ser visível no ato mal para ser constituído como mal em si mesmo. A justiça divina é maior e mais abrangente do que aquilo que chamamos de justiça civil, pois a justiça civil não computa como crime o mal simplesmente intencionado, visto que um tribunal humano não tem capacidade ou competência para avaliar e pesar os corações. Deus, contudo, esquadrinha o nosso interior e conhece a pureza e a impureza do nosso coração (Gn 8.21), e assim sendo ela não está alheia ao julgamento divino. Portanto o que constitui o mal já está em semente no desvio do coração em relação à vontade de Deus, e podemos concluir daí que o desejo maligno de Eva de desejar o fruto já é condenável antes do comer o próprio fruto, pois o desejo impuro é desvio e fonte da poluição humana que o inabilita à sua salvação.

Sendo assim, confiemos na graça salvadora de Deus que nos fornece uma esperança por causa de Cristo, pois é de Cristo que vem a nossa justiça e não de nós mesmos.

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