domingo, 30 de janeiro de 2022

Império e Transgressão

    A história da Torre de Babel é a história do primeiro levante grave contra Deus cometido pela humanidade após o Dilúvio. A ordem divina de crescer e multiplicar assim como povoar a terra é significativa para entendermos a ira de Deus sobre Babel. A narrativa cobre Gn 11.1-9 e descreve que partindo do lado oriental homens se estabeleceram na planície do Sinal, e intentaram queimar tijolos e usar piche betuminoso para construir uma torre que tocasse os céus. A finalidade deles eram duas: 1) fazer o nome grande; 2) não serem espalhados pela terra. Ao ouvirmos essas duas coisas nos lembramos de duas outras: 1) que os filhos das mulheres que coabitaram com os anjos no período pré-diluviano eram famosos (Gn 6.4); 2) que ao não quererem ser espalhados pelo mundo eles transgrediam a ordem frontal de Deus de povoar a terra (Gn 9.7).

    Temos em Babel a primeira tentativa de concentração de poder do mundo antigo. E entre os seus podemos contar com a presença de Ninrode, o descendente de Cam que foi chamado de o poderoso caçador diante do Senhor (Gn 10.8,9). Alguns, como Lutero, identificaram Ninrode como o líder do empreendimento da Torre de Babel, porque ele foi nomeado como o rei de Babel (de onde viria a Babilônia). Isso é muito possível, e como o primeiro homem destacado e poderoso do mundo pós-diluviano ele foi também o primeiro a organizar o primeiro levante contra os céus, buscando construir uma torre que tocasse a morada de Deus. Isso nos faz lembrar a profecia de Isaías, proferida séculos mais tarde contra o rei de Babilônia Nabucodonosor: Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva [...] E tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu, e, acima das estrelas de Deus, exaltarei o meu trono, [...] Subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo (Is 14.12-14).

    O projeto da Torre de Babel era, portanto, um projeto imperial, a primeira tentativa de concentração de poder, e por isso de estabelecimento de controle sobre as pessoas do mundo pós-diluviano. É sob essa luz que devemos entender a narrativa, e é interessante notar que todos os impérios antigos se seguiram de Cam, pai de Ninrode: o império egípcio (Mizrain – Gn 10.6), o assírio (Nínive, cf. 10.11), o babilônico e os reinos cananitas (10.6), os quais lutaram duramente contra Israel. Aqui entendemos tanto a maldição de Cam, filho de Noé, como a razão do juízo sobre Babel, pois para que fosse destruída a intenção má os construtores foram confundidos em suas línguas. O importante é notar que o império da transgressão é destruído por dentro, já que o vício pecaminoso faz com que cada um em seu egoísmo fale apenas sua língua. Babel (que vem de בָּבֶל), cuja raiz significa desordem, confusão, é o oposto do pentecostes, pois em pentecostes mesmo em línguas diferentes todos se entendiam porque guiados não pelo pecado e revolta, mas pela amizade e pelo Espírito do Senhor (At 2.5,6).

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